A QUARTA DIMENSÃO DO FUTEBOL

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Tenho convivido com uma galera que joga pouco ou quase nada de futebol, mas sabe muito sobre como ele funciona dentro das quatro linhas, a partir dos simuladores de jogos, de excepcional qualidade, cada vez mais caros e inacessíveis, mas que fazem a festa da garotada. Ninguém quer jogar com a versão desatualizada e dessa forma deixar de saber de cor e salteado a escalação dos grandes times do mundo, que efetivamente interessa e importa para a cena do futebol. E esse mundo foi deslocado pelo episódio FIFA, pós Copa 2014 no Brasil.
Antes no entanto disso, e sabendo que as consequências são ainda pouco visíveis, e nesse caso me abstenho da árdua e triste missão de ser o visionário, para exercer um prazer mais simples: assistir partidas de futebol em quatro dimensões.
Inaugurei uma nova modalidade, ao menos para mim e entre os meus, frequentando assiduamente o Maracanã e eventualmente assistindo os jogos pela TV. Nessas circunstâncias, para evitar a contaminação do contato com a opinião da torcida e dos amigos de profissão, passei a levar um fone de ouvido com bloqueio de ruído acoplado a uma coleção de música clássica. Não satisfeito com o efeito dessa condição sensorial, passei a fotografar as partidas utilizando sempre que as assistia, óculos escuro, inclusive nas partidas noturnas.
Quero trazer aqui uma possibilidade interessante de releitura das partidas, com acréscimos não determinados pelo juiz. Os acréscimos a que me submeti foram as notas de um Mozart, não o zagueiro do Flamengo, de um Bach, ou Vivaldi. Um bom Chopin as vezes caía muito bem na monotonia de uma partida no sereno das noites de primavera. Ficavam fragâncias no ar. Pouquíssimas vezes etílicas, como as que assistimos percorrer copos e bocas de jogadores limitados, para dizer o mínimo.
Quando fiz essa declaração ao vivo na rádio 104,5 FM na presença dos participantes, e afirmei que vi o jogo ouvindo música boa, frequentando um clássico, ao menos com os meus ouvidos, percebi que se voltaram assustados. Estaria eu brincando com o assunto ou teria enlouquecido de vez?
Creio que o jornalismo se tornou comum, redundante e até certo ponto, banalizado. Atingiu um patamar de “mesmismos”, onde o risco de uma palavra ou expressão nova ficou limitado a trazer uma mesa tática digital, como se a tecnologia fosse melhorar a qualidade do discurso de quem comunica e de quem ouve. A tridimensionalidade do artefato rebate ao FIFA 2015 e a seus jogadores virtuais. E praticamente só isso.
Nesse cenário de obviedades e repetições enfadonhas, é claro que a galera mais animada acabou optando por se divertir. E os caras mais linhas duras do rádio e tv, como o Iata Anderson não chegaram a ficar muito satisfeitos com esse resultado que retira sobremaneira a autoridade, o respeito e a credibilidade dos profissionais.
É uma hipótese. Mas percebo a linguagem e tudo que nos cerca caminhando para um ambiente de mais e mais mesclagens. A ponto de que o próprio jogo, a partida, ter se tornado mais espetáculo do que dinâmica competitiva em si. Não vemos mais jogadores do tipo cães ferozes e babando dentro de campo, mas sim um ambiente de menor hostilidade, mais focado nas teatralidades, desde que haja é claro futebol, senão também vira só teatro e aí não rola.
Desse lugar, cada vez mais isolado para onde fui me deslocando, comecei a ver as partidas de um ângulo muito diferente dos meus pares. A quarta dimensão do futebol não é exatamente aquele lugar para onde os clones do ator Hugh Jackman saíam de uma gaiola de mágica para a morte, no filme “The Prestige” (O filme também não era 3-D ou 4-D).
O que se pode fazer de uma cadeira de um Estádio padrão FIFA, com os recursos midiáticos nas próprias mãos é infinito. Tanto para dentro, quanto para fora. Você pode entrar com componentes e interferir no que vê ou sair com eles e interferir na vida dos que estão lá fora. Pode se transportar para épocas por via musical, pode ultrapassar a velocidade rápida do obturador e da bola com o instinto de um morcego, ou de um cego demolidor.
As unidades objetivas de comunicação vão pouco a pouco se desintegrando na frente de minhas retinas que já não precisam ver tão nitidamente para fotografar, se o calor trouxer vapor e gotas de suor que embaçarão seus óculos, piorando ali o que já era precário, obrigando a aguçar institntos, para quem sabe até, um dia encontrar uma mulher viajada do planeta OA, a “Lanterninha Verde”, charmosa e galante, também amante dos animais e usuária de belos anéis e mechas de cabelo verdes, fez brilhar minha consciência cósmica.
O futebol na quarta dimensão pode nos proporcionar uma visão transcedental, que une, amor, amor, amor e amor. Nesse quarto escuro onde as revelações acontecem, tudo se manifesta em harmonia, tudo faz sentido, tudo se joga dentro das quatro linhas, mesmo que você esteja por fora delas.

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