O ano era 2022. Os votos couberam a Alexandre de Moraes, Edson Fachin, Carmen Lúcia, Ricardo Lewandowski, Rosa Weber e Marco Aurélio, Kassio Nunes Marques, Luis Roberto Barroso, Luiz Fux, Dias Toffoli e Gilmar Mendes. O placar foi dividido e apertado, um 6 x 5 que só demonstra o grau de (des)comprometimento da Suprema Corte com quem trabalha, com quem já tem idade avançada e com quem não tem como se defender, pagando quantias estratosféricas aos grandes escritórios de advocacia do país.
Enquanto o Ministro do Trabalho vocifera aos quatro cantos que a fila no atendimento do INSS é um fato absolutamente normal, instrumento que reforça a malignidade perversa de nossos governantes, esses da fila vão morrendo, enfraquecidos, pauperizados, desmilinguidos. Toda essa desmoralização do STF é apenas um jogo da contabilidade política em busca de seus resultados, em geral nocivos a população e corroborador dos vícios acumulados pelo Estado. Não se trata de instaurar a ausência da governabilidade, como se estivéssemos vivendo nos primórdios do capitalismo selvagem. O problema atual é a gestão apenas em causa própria, aliada a um desligamento da realidade e de seus desafios, para além das bravatas, bazófias e ridículos.
A tese de Revisão de Vida Toda, votada em 2022 foi considerada acertadamente como Constitucional pelo STF e correria paralela a nova regra, a do Sistema Previdenciário. Sem entrar em detalhes quanto as vantagens e desvantagens de cada uma, faz apenas dois anos da decisão Suprema. A puxada de tapete realizada no dia 21 de março desse ano de 2024 dá uma amostra do grau de insegurança jurídica em que o país se encontra. Um verdadeiro bundalelê, uma instabilidade legal que nos deixa sem lei, mesmo na última instância a quem deveríamos mais confiar.
Mas afinal, o que de fato mudou nesses dois últimos anos? Basicamente a lista de juízes do STF. No caso, saíram três, Ricardo Lewandowski, Rosa Weber e Marco Aurélio que votaram favoravelmente ao direito dos que contribuíram antes de 1994 de calcularem seus proventos com base nesses rendimentos anteriores. Entraram os novinhos, entre eles alguns débeis mentais que sobrepuseram o argumento de “Economia do País” em detrimento do benefício de direito da população. Uma tese sem parâmetro algum essa história de “Economia”, justo de quem mal utiliza o dinheiro público.
Se quiserem colaborar com a economia do país, reduzam a ineficiência das atividades públicas, onde só essa semana tivemos notícias escandalosas, tais como uma Cidade da Polícia de onde foi roubada uma máquina capaz de produzir 2.500 cigarros por minuto, com mais de 5 toneladas, só transportável de caminhão, de um galpão dentro dessa cidade em pleno Rio de Janeiro. Máquina essa apreendida pela polícia em Duque de Caxias, pouco tempo antes. Não há registro em câmeras, as câmeras funcionam atualmente em regime descontrolado, embora o poder público venha diariamente anunciar que fez investimentos da ordem de 2 bilhões de reais em segurança no Estado do Rio de Janeiro.
Há muitos buracos por onde os recursos públicos escoam, sem tratamento adequado, e aí, aparece uma nova turma de juízes no STF para desfazer uma regra legítima e retirar direitos adquiridos, de forma retroativa? Um Escárnio, ao qual devemos agradecer a soma do velho com o descarado. Prejudicar aposentados é um ato covarde. Manter na fila equivale a uma sentença de morte, no estilo kafkiano.
O ano? 2024. Os votos couberam a Alexandre de Moraes, Edson Fachin, Carmen Lúcia, Kassio Nunes Marques, Luis Roberto Barroso, Luiz Fux, Dias Toffoli e Gilmar Mendes.
Ricardo Lewandowski, se tornou Ministro da Justiça, no lugar de Flávio Dino, que se tornou juiz do STF, num troca-troca funesto, de um político que se diz comunista e votou contra os aposentados vulneráveis. Fico me perguntando, imagina se não fosse? A juíza Rosa Weber, que se despediu da casa incensada de homenagens, mal sabia que em seu lugar apareceria um jovem ambicioso de nome Cristiano, conhecidíssimo por defender causas e ganhar, não só elas, como muito dinheiro de quem tem pra pagar. Não será o caso dos prejudicados pela sua decisão contra o interesse do povo trabalhador.
Ao se juntar aos recentes colaboradores da precarização e quase extinção do Sistema Previdenciário brasileiro, os juízes que de 2022 para cá substituíram seus pares cometeram dois pecados capitais: traição de uma cláusula já votada por puro casuísmo, coisa de mal perdedor e fabricaram um novo bicho na sala do STF, o ornitorrinco jurídico, um híbrido que nenhum estudo biológico vai conseguir explicar na arqueologia jurisprudente para o futuro. O Brasil é uma piada, e tudo isso se deu a luz do dia, sem maiores debates acalorados ou veiculação substantiva por parte da imprensa especializada. Foi apenas uma notícia, acumulada entre tantas outras, sem o peso da relevância devida, que encontramos em episódios como os que envolveram a rasteira dada por Macron no Legislativo francês, e que levou a população inconformada com os termos da mudança na Previdência de lá a manifestações de rua contra a visão financista de um agente de banqueiros.
Você não morreu, que pena para o Governo Federal, que terá que arcar com o direito Constitucional da sua aposentadoria, já que meteu a mão no seu salário ao longo de toda sua vida. Te roubou por toda a vida, mas não calculará o que lhe deve com base nisso. O cálculo por toda a vida da sua previdência acaba de ser eliminado por uma votação extremamente polêmica, sem qualquer veiculação pela imprensa ou mobilização de sindicatos, entidades de classe, sociedade em geral. Prova cabal da destruição dos pilares da proteção aos vulneráveis, no caso idosos em idade de aposentadoria, que se tornarão mendigos, para que o governo deixe de tirar do bolso 500 bilhões de reais.
Juízes sem qualquer tipo de preparação específica, baseando a decisão no estado falimentar das contas públicas, inchadas e ineficientes. Em lugar de buscar corrigir erros crassos da administração pública, um bando resolve atingindo inocentes que passam a ter seus direitos capados.
Muita miopia.