Escassez de Crédito dos Bancos Privados

Tá chegando a bolha? Ela vem sendo alimentada a pão de ló. Mas o Brasil é tão rico que qualquer bolha aqui é engolida pelo sumidouro do buraco-negro nação…

Quando trabalhava no mercado financeiro, sempre tive a sensação de que as coisas mais importantes sobre as bolsas nunca eram publicadas nos jornais. Essas informações valiam muito porque davam muito dinheiro a quem as comprasse.

E foi assim que tive acesso a informações acionárias sobre os bancos. Naquela ocasião, as instituições financeiras estavam deslocando a lucratividade de suas operações de uma ciranda, chamada inflação, para uma outra: o crédito. Nessa época o Brasil viu nascer, uma atrás da outra, empresas que emprestavam dinheiro para pessoas, com grande facilidade. Olhei para a participação acionária delas e encontrei nas maiores apenas bancos .

A FININVEST foi a mais famosa daquele momento histórico. O momento do “pseudo-fim” do monstro inflacionário. Apenas recapitulando, esse monstro destruía uma grande parte do poder de compra dos trabalhadores. Os sindicalistas lutavam para obter a recomposição do pedaço perdido e nesse meio tempo os bancos embolsavam a lucratividade dessa operação. O trabalhador sempre perdia.

Perdia desde dos congelamentos de salário sem que os empregados tivessem o direito de reajuste de salários. Desde o saudoso Mário Henrique Simonsen, que ajudou a ditadura nesse projeto, com o brilhante PAEG. No seu tempo, sindicato não podia fazer greve e os ganhos previstos por produtividade, nunca foram repassados.

A quantidade de empresas semelhantes a FININVEST se multiplicaram. Emprestar dinheiro, oferecer crédito a juros extorsivos se tornou a atividade mais lucrativa do mundo. A hegemonização desse mercado dominado pelas grandes instituições financeiras, levou a extinção de uma classe de profissionais considerados pelo governo como criminosos: a figura do agiota.

O agiota passou a ser praticamente eliminado por concorrência desleal. O mesmo caso dos donos de casas de jogos ilegais. Só o governo e seus amigos podem explorar o jogo e o empréstimo vil no Brasil.

Ficou claro para mim desde então, que pelas prática dos juros altos o modelo se esgotaria. Calculei. Imaginei com os meus botões, o que aconteceria com o sistema e quem pagaria a conta. Era claro para mim que a inadimplência estaria diretamente associada a velocidade de compra do consumidor. Se o consumidor, do alto da sua ignorância, persistisse em se endividar enlouquecidamente o abismo chegaria mais próximo. Mas por etapas.

Na primeira etapa, em função da estrutura familiar multifacetada da economia dos brasileiros mais pobres, o cabeça da operação perderia sua capacidade de endividamento. Com seu nome no SPC e Serasa, suas certidões negativas passariam a impedir que ele comandasse a compra de um liquidificador que fosse nas Casas Bahia.

Numa segunda etapa, sua mulher. Numa terceira, o filho que vive na mesma casa. Enfim, numa família típica de classe com capacidade de endividamento, o ciclo poderia se repetir por umas quatro a seis vezes. Namorei uma menina de uma família assim. A família toda dependia de seus cartões de crédito. Foi a única deixada em regime de invulnerabilidade na mesa desta jogatina.

Mas a pergunta que me fazia era sempre a mesma: a quem beneficiava essa prática do dinheiro fácil? Aos ingressantes ao sistema financeiro. E foi por isso que dezenas de empresas do setor produtivo migraram parte de suas atividades e criaram um braço nessa praia cheia de oportunidades.

Os empresários de então, pareciam aqueles turistas aportados em ilhas de Turismo Sexual, ávidos por sexo fácil e barato. Nesse caso, dinheiro faturado mole, mole, as custas de pobretões que sonham em realizar consumo e sonhos a qualquer preço.

Vi os cartões de todas as redes comerciais se multiplicarem. Livrarias, lojas de celular como a Oi com o PAGGO, C&A, etc. Ganharam muito, mas muito dinheiro de todos que compraram com crédito. Aposta com jogo de cartas marcadas. Ganharam todas e ficaram mais gananciosos. E foi nesse lance paradoxal que os ganhadores se embriagaram neste rio de dinheiro e esqueceram de calcular o esgotamento do modelo.

O ganho fácil gera um desejo desenfreado de ganhar mais. Deixa as contas de lado e mergulha num condicionamento onde a experiência anterior acaba levando você a acreditar que ela vai se repetir ad infinitum. Mas o que acontece é exatamente o oposto. Esgotamento a partir de uma erosão calculável do sistema e crise profunda.

Nós chegamos a ela, felizmente antes de que a nossa própria, a interna tivesse chegado. Isso nos salvou de um quadro mais grave por um lado. Não estamos sozinhos na merda. Há merda para todos e principalmente para os mais ricos. Isso é muito saudável e nos permitiu inclusive os arroubos vistos de nosso ignóbil comandante da República. Sem nenhuma capacidade de calcular o que aconteceria nos meses seguintes, o que passou a ser chamado de Bufão da República, arrotou riqueza e saúde pelas política monetária “austera” adotada no país.

Olhei de Camarote o discurso capotar. Vi o presidente do Banco Central claudicante dentro do Congresso Nacional. A pompa foi substituída por um pouco mais de sobriedade. Tipo assim: “caralho, a situação tá preta, tô de orelha em pé e não sei o que vai acontecer…” Tenho amigos reclamando de não estarem mais “realizando”. Será que todo mundo achava que esta ciranda consumista, fagocitária e insana se manteria pelo planeta, do modo como o american way of life resolveu vender para todos nós?

A população endividada viverá um novo tempo. Quero dizer um tempo bem negro. Acostumada a acreditar que a inflação acabara, por conta de linhas de crédito fácil e impagável, chegou a um novo lugar. O lugar onde o agiota desapareceu e não terá a quem recorrer. Quem assinou os contratos para comprar moto da Honda antes, se deu bem. Acabou. Quem quiser, daqui para frente vai encontrar rigor e barreiras intransponíveis. Acabou a facilidade do crédito, antes que o últimos dos familiares tivessem seu nome sujo no SPC.

Não deu tempo Brasil. Valeu Wall Street. Vocês salvaram a integridade dos últimos dos moicanos tupiniquins, que mesmo querendo, não conseguirão ter o nome na lista negra. Valeu Wall Street. Vocês salvaram os brasileiros do único cartão de crédito do mundo que conheço que não realiza débito automático, o PAGGO. Graças a Deus descontinuado pela Oi. Enfim, os monstros do capitalismo estão com as barbas de molho e o primarismo amador será banido, ainda que provisoriamente.

A única coisa que não se resolverá é a inflação. Vocês acompanharão nos próximos anos, uma retomada dos velhos mecanismos de faturamento dos bancos. Pela erosão dos salários não reajustados. Pelo não reajuste do salário mínimo, nosso velho indexador para quem compra e consome na base da pirâmide da economia. As greves vão nos incomodar com mais constância e voltaremos a falar sobre isso nos jornais. O monstro da inflação voltou. Ele, na verdade nunca foi. Estava escondido por debaixo do tapete de créditos inflacionados (absurdos).

Quem vive de produtos e comércio, repassa. Quem tem renda fixa, entuba. E você? What about You? Tube or not Tube? Vai entubar a inflação ou vomitar na cara dos banqueiros de plantão, com cara de sabão em plena rede nacional de televisão?

Vladimir Cavalcante
New Executive Officer da AREEVOL

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