UM CARIOCA NA RESSACA DE NATAL

Cariocas

Terminado o Natal e o enterro dos ossos, com maçarico queimando tudo, a 60 graus de sensação térmica, eis que aparece um fim de tarde nublado e chuviscando.
Praia e calçadão vazios, sobressaem as centenas de lixeiras da Companhia de Limpeza Urbana, no deserto de areia, sem pessoas. O cheiro insuportável de esgoto, na altura do Posto 8 em Ipanema me incomoda. Vivo em atmosfera com melhores aromas, ainda que de calor insuportável.
Cabe investigar a origem dessa discrepância.
Anunciam dois palcos para os shows de Copacabana. A moda do momento num lado, o samba no outro. Para dois milhões na praia é pouco. Já tivemos mais palcos para 1 milhão de pessoas.
A violência promete ser combatida? Pela violência e sem inteligência, é impossível. Com apenas 3 mil para 2 milhões, esquece. Nesse momento, todos querem tirar férias. Há formas melhores de cuidar da sociedade.

Vai terminando um ano difícil. É que as métricas seguem desatualizadas, quando confrontadas com a realidade. E as narrativas que protegem os responsáveis ao invés das vítimas, cada vez mais caras e sofisticadas. Copacabana é o retrato do Brasil, uma espécie de termômetro do que está acontecendo ou para acontecer. Pelo menos o sol nas areias da praia ainda não foi soterrado pelos prédios de altura incompatível, tal qual já se deu no desastre de Recife. Mas estamos caminhando para isso. Algumas licenças ali, outro arranjo nas sombras aculá. Afinal, dirão os mais gananciosos, “pra que o sol?”. E é assim que vamos matando a galinha dos ovos de ouro. A verdade é que as metrópoles já não representam as taxas de crescimento acima da média do PIB no país, isso cabe as cidades do interior, os novos protagonistas, sem surpresas. Mas preservar a beleza para os cariocas é papel dos…

Leitores de livros.

E foi por isso que passei na Livraria Travessa do Shopping Leblon, para curtir a vitrine montada por gente de bom gosto e cultura bem acima da média, sim, porque lida. Sei que em tempos de politicamente correto, da noção de que todos são iguais e coisa e tal, explicitar a distância entre os que tem acesso a leitura continuada e os outros é quase impossível. Virou assunto tabu falar dos 40% de analfabetos funcionais ou das crianças da geração COVID que não aprenderam a ler e deveriam receber cuidados especiais, aulas de reforço específicas, para não perderem o bonde da história. Já faz algum tempo que escuto a justificativas como: “se o Presidente é analfabeto, pra que estudar?”, ou “se o jogador de futebol é milionário, pra que estudar?”. Uma grande parte dos jovens é levada a acreditar em milagres. Não é preciso legenda. A defasagem do discurso em uma rodada pela cidade. São Paulo idem.

Fico me perguntando, qual a parte ainda não circulou pela cidade, para além das propagandas oficiais sobre reformas e modernização do BRT, e ainda não esbarrou com o crescente número de moradores de rua, em qualquer bairro, inclusive nas supostas fortalezas inexpugnáveis da população emergente da Barra da Tijuca?

Não falta na população o sentimento de gentileza e solidariedade. Mas alguns problemas que saltam as olhos, se tornaram tendência sombria para 2024, ano de eleição local, as municipais. Quem trará novas propostas, além do velho discurso de maquiagem? A prosperidade existe, o país, o estado e o município nadam em dinheiro.

Tic, tac, tic, tac, tic, tac, tic, tac, 2024 mil vezes. Não deixe a bomba explodir, há tempo pra desarmar.