O PASSADO NÃO EXPLICA O AGORA

Não se assustem com a afirmação de aparente menosprezo ao passado, explicitada no título. Há um exagero proposital nela. Quem lê o que escrevo sabe o valor que dou as relações entre passado, presente e futuro. É claro que todas as etapas da vida estão encadeadas. Aproveito até para recomendar o maior sobre o tema, Marcel Proust, e sua magnífica obra “Em Busca do Tempo Perdido“, que se tornou tão cult entre nós cariocas que foi parar até nos eventos de filosofia. Feita essa mea culpa, vamos ao que interessa enfatizar.

Quando envelhecemos, trazemos um volume assombroso de vivências. Com mais de meio século na face da Terra, desde que bem vividos, uma pessoa é rica. Creio nisso. Mas a vida não é só feita de acumulação de experiências. Muitas passam a viver apenas circulando nessas gavetas de memórias, o que é uma coisa linda de se ver.

Dessa gaveta podem sair análises mais elaboradas sobre aquilo que viveu, sobre como era quando menor, na adolescência, na juventude em que trabalhou. Ao circular entre seus vários momentos, pode recuperar com o sabor de um vinho envelhecido as novas sensações de antigos carnavais.

Tudo isso é lindo, tem seu valor na ocupação de espaços de troca.
O problema é quando estas memórias se tornam repetitivas, a ponto de impedirem a experimentação do agora. É que pode acontecer um adormecimento capaz de produzir esse congelamento do tempo, no passado. Essa tendência se torna perigosa, na medida em que impeditiva do desfrute do instante, a espera para ser vivido, com a ajuda de tudo que veio antes, mas único, porque os momentos não se repetem.

As sensações e sentimentos do dia de hoje, são para o dia de hoje a sua hora da estrela, o ápice do sol sob sua cabeça, o calor que a vida lhe solicita. Não se deixe levar pelas lembranças, esquecendo do mundo ao seu redor e se alienando das oportunidades que ele lhe oferece a cada segundo.

O agora, se repete sem ser repetitivo, enquanto estivermos vivos. Fique atento a ele e desfrute da sua seiva anímica.