O QUE É UM SHOW GRÁTIS, QUEM PAGA A CONTA E O NEOLIBERALISMO DE ARAQUE

Tenho encontrado um bando de Pantaleão, reminiscentes do coronelismo nacional – bem ultrapassado mas ainda muito presente – que preferem não entender o significado da palavra “GRÁTIS”.
Vamos lá. Entrada grátis é quando a pessoa não paga o ticket pra estar na festa, no evento, no acontecimento. Exemplo, baile funk na favela. Imagino que você, morador de alguma comunidade carioca, já foi a algum. Outro exemplo, show de ensaio de quadra de Escola de Samba, no meio de semana, com gratuidade pra comunidade. Fico com dois exemplos clássicos da nossa realidade, para dizer que em nossa tradição, cidade cultural que somos, a gratuidade é uma marca. Diferentemente dos cercados com abadás do carnaval da Bahia, por aqui, renasceram os blocos de rua, com milhões de participantes, não pagantes. São peculiaridades exclusivas da vida carioca.
Tudo isso não significa no entanto que a realização desses eventos não tenham um custo, e que alguém pague por ele.
Quero falar sobre a articulação invejável, que levou a viabilidade do único show da Madonna na América do Sul. Repito a palavra ÚNICO, dessa vez em vários sentidos. Primeiro porque a relação da Rainha do POP com a cidade do Rio de Janeiro é única e longeva. Não será a inveja que separará nosso lugar dessa estrela de primeira grandeza. A escolha foi dela, o amor pelo lugar existe. O momento é perfeito, Copacabana é dos milhões, em toda sua extensão faraônica, mesmo sem ser deserto. Frequento os Reveillons desse bairro faz mais de meio século, quando meu avô nos levava para a cobertura do seu irmão, no Lido, de onde presenciei de camarote as cascatas do Hotel Le Meridien, pioneiro da festa popular. Estive nessas areias na gravação do DVD – coisa antiga – de um dos namorados da Madonna, o Lenny Kravitz, que certamente faz parte dessa história que só tende a crescer. Ano passado, vi com melancolia o show de celebração do Alok se tornar palco de assaltos, roubos, facas e muita desorganização. Faltou muita coisa, a violência crescente da cidade retirou parte do brilho do evento. Nunca é possível saber o que vai acontecer numa ocasião de larga escala como essa, a própria Madonna já teve show suspenso na França por conta de um palco que caiu. Os atentados terroristas crescem em ousadia e o caso envolvendo Israel e o pai do Alok no conflito do Oriente Médio, além do atentado num Teatro no centro de Moscou esse ano, são prova de que não existe sistema invulnerável. O que nos salva é a vibe, seja lá o que signifique isso pra você.
O futuro é o Brasil, quero falar disso pra vocês. Os negócios envolvendo a imagem da Madonna no Brasil atingiram seu ápice agora, no exato momento da sua leitura. E eles não se limitam aos valores da planilha da produção do evento, a qual o Folha de São Paulo teve acesso. Está numa outra dimensão, noutro patamar, diriam os rubro-negros que garantem que a diva é flamenguista.
A valor da associação das marcas está no futuro. Mas não passa exclusivamente pela disputa de perfumes da Jequity versus Avon ou Hinode. Entrou em cena o abstrato de uma campanha sobre o futuro, liderada pelo banco Itaú. Estudei cada personagem icônico escolhido pela empresa, Ronaldo Fenômeno, Fernanda Torres, Jorge Benjor inclusos. É alguma coisa de arrepiar, justamente no momento em que estou idealizando a entidade Kaza do Futuro, que já começa a ser o lugar que você habita. O futuro é parte da nossa mitologia pessoal, nesse coletivo inédito, de uma Cidade-Palco. Somos donos do maior espetáculo da Terra, esquece, e ele é GRÁTIS.
A cereja do bolo da campanha de marketing de uma constelação de astros valiosos, escolhida pelo Itaú, o mesmo que assina as bikes da orla carioca, é a Madonna. Com a transmissão ao vivo, repetindo o que já se faz na festa de fim de ano e o que foi feito com Alok, o investimento vai alcançar as regiões planetárias com as marcas envolvidas.

Do lugar que me encontro, nuvem do tempo, vi muitos eventos. Espero ver muito mais. O Rio de Janeiro é uma Cidade dos Mega Eventos. Essa vocação não nasceu hoje. Possui vários formatos.
Duas décadas atrás, escrevi o Plano Estratégico para um grupo de empreendedores ambiciosos, desejavam ser os maiores do país. Usei números, escolhi os maiores do Rio:
– Reveillon
– Carnaval
– Passeata LGBT
Os jovens tinham restrições as minorias com orientação de gênero diferente da deles. Não fizeram. Só nesses últimos anos abriram essa vertente.
O show da Madonna me faz lembrar de gente que incitou o “não vai ter Copa” em 2014, o “sou contra as Olimpíadas”, ou o “eu odeio o Rock in Rio”, e “derrubaria o Sambódromo pra construir uma igreja”.
Provavelmente não acompanham as votações para que a classe empresarial de eventos e restaurantes mamem 15 bilhões de reais esse ano via PERSE.

O bando de descontentes, recalcados e contrários a existência de mais uma data equivalente ao Reveillon, no mês de maio, deveriam fazer uma visita a São Petersburgo, que celebra todas as noites do ano, no abrir das pontes uma espécie de mini-Reveillon. Que delícia, moraria lá nos meses mais quentes do ano. É uma cidade que me adotou na Copa de 2018. Madonna é apenas a cereja do bolo de uma campanha de marketing de um banco celebrando seus cem anos, abrindo caminho para o futuro. A playlist com 18 itens no youtube é uma aula.
Ainda estou produzindo a planilha de resultados. Aos invejosos, deixo a certeza de que ainda há tempo para conversão. A inteligência exige copiar as melhores práticas.
Ou, quem desdenha, quer comprar.