ONDE COLOCAR O BILAU DO DAVI DE MICHELANGELO?

Ao olhar para o bilau da estátua de Davi, é provável que muitos se recordem da frase “tamanho não é documento”. Quero dizer que esses estão completamente enganados. Tamanho sempre foi documento, mas de uma outra perspectiva. Entre os latinos se utiliza muito a expressão “bater o pau na mesa”, como referência de poder.

É no mínimo curioso, pensar que uma estátua com mais de 5 metros e suas 8,5 toneladas, feita a partir de um bloco de mármore, com o propósito de simbolizar a próspera cidade de Florença, tenha sido esculpida por um jovem de 25 anos, Michelangelo, com a benção de Leonardo Da Vinci e outros notórios que escolhiam verdadeiros talentos para difíceis tarefas. Uma obra para defender um lugar, que se tornaria a maior referência para a arte moderna, a primeira do gênero. O gênio-artista, inserido no contexto da Renascença é um dos incomparáveis da história. Fico me perguntando, como a igreja daquele período entre 1400 e 1550 se tornaria a seguir tão careta.

O fato é que coube a 30 cidadãos Florentinos, incluídos aí vários artistas, dentre os quais Leonardo da Vinci e Sandro Botticelli, decidir onde colocar Davi e seu bilau. A dúvida era grande, e no início havia pelo menos 9 opções, nenhuma delas o seu ou o meu recanto sagrado, santuário doméstico. Sobraram duas fortes concorrentes. O teto por onde passeiam os gatos, ou a entrada do Palácio. Quem poderia imaginar nos dias atuais alguém ter a audácia de colocar um bilau na entrada, por exemplo, do Congresso Nacional? Impensável, tamanho o grau de cultura e conservadorismo existente em nossa realidade. O fato é que Botticelli foi mais longe e queria mesmo era que o bilau de Davi fosse parar na frente da Catedral, para chocar todas as carolas de plantão – ou quem sabe lhes oferecer noites com a imaginação ardente. Venceu a turma do Palácio.

A dimensão histórica da obra de arte de sua época nos levou a uma comparação entre os padrões estéticos separados por mais de 500 anos, quase a idade do Brasil. Me refiro as mudanças de preferências e adoções de padrões de tamanho. O grande e o pequeno seguem lado a lado ou em paralelo? Me parece que toda a influência no imaginário humano sobre a beleza erótica do bilau pequeno de Davi já foi ultrapassada. Afirmo isso sem pretensão a verdade ou a qualquer comprovação científica, me baseando apenas nas produções da indústria pornográfica americana.

A partir dela é fácil perceber a preferência pelos tamanhos grandes, no estilo kid bengala. Daquilo que se vê e se ouve, pode-se tirar muito pano pra manga nessa conversa de ordem estética. Para além dos tamanhos P-M-G dos respectivos objetos de desejo fálicos, naturais ou próteses, causa mais impacto na indústria audiovisual da pornografia as grandes proporções. Tanto é assim que entre as mulheres se espalhou o mantra sobre os seios grandes, as bundas enormes e as pernas volumosas.

É um outro tipo de concepção, onde volume é aditivado com no mínimo 500 mililitros de silicone, próteses ajustadas para as roupas, criando a sensação de glúteos enormes, e outros recursos decorrentes de muitas horas dedicadas a academias e ingestão de quantidades de substâncias coadjuvantes que não cabem no meu caderno. Tudo isso é parte do pacote do grande como símbolo de poder, mesmo que seja fruto de enorme esforço para modificar o rumo do rio, o movimento e fluxo das coisas, pois a ideia de se aperfeiçoar, como uma escultura viva de si é um conceito artístico individual. O problema aqui é ser cópia de um outro, sem autenticidade ou assinatura própria, seguidores de padrões impostos por uma ditadura estética do sucesso.

Complicou pra muita gente, o bilau do Davi de Michelangelo perdeu, pode ser que eu e você também.