UMA INTELIGÊNCIA NÃO TÃO ABERTA

Open Source pra quem? Open Data pra qual?

O bafafá envolvendo o assunto da moda em tecnologia recebeu o nome de inteligência. É de lá que surge a empresa mais valiosa em tão pouco tempo. A Open AI vale 80 bilhões de dólares. Ela não é tão nova – criada em 2015 – mas o seu braço integrado a investidores de peso é bem mais recente. Para quem era uma instituição sem fins lucrativos, dá pra afirmar que ela se desviou bastante desse caminho. Quem liderou essa mudança de rumo foi Sam Altman, recentemente afastado do comando, subsequentemente contratado pela Microsoft e responsável pelo motim de quase 90% dos funcionários de lá, que também querem ser contratados pela MS, que deve estar por trás das manobras para afastar o Conselho, que acaba de reintegrar Altman ao cargo de CEO.

Toda essa confusão coloca incerteza nos rumos do ChatGPT? Claro que não, claro que sim. Algoritmos capazes de por tentativa e erro, corrigir suas ações – o que chamamos de aprender – já existem faz algum tempo. Mas a questão disruptiva em torno dessa nova fase dessa tecnologia é a sua interligação com grandes massas de dados, e com isso assumir uma condição de supremacia preditiva. Foram etapas que levaram décadas, bancos de dados acumularam uma massa burra de registros, o Data Mining permitiu garimpar essas bases com algum conhecimento estatístico, traçar tendências, correlações, médias de ocorrências. A integração mais recente dessas bases de dados gigantes em centros de cálculo com alto poder de computação nos deram os Big Data. É nessa fonte que reside a inteligência computacional autônoma, que aprende a partir de uma realidade empírica.

A isso damos o nome de Generative AI. É esse sub-tipo específico de Inteligência Artificial que permite automatizar certas atividades até então humanas, e desse modo criar espaço para automação na produção de predições, criações, descrições, enfim do campo exclusivo de analistas e criativos. Ao aprender com tudo aquilo que fomos capazes de criar até hoje, as máquinas farão com isso, o que já fizeram com as partidas de xadrez, desde Kasparov: ganharão o jogo.

Mas não se iludam, o aprendizado feito a partir de premissas falsas, não leva a grandes revelações ou transcendência. A máquina, tal qual as crianças, para serem capazes de realizar feitos maravilhosos, precisam receber uma qualidade de dados que as oriente aos resultados que potencialmente podem alcançar, até mesmo nos superando pela que chamo de força bruta. O cálculo computacional atual é de tal ordem poderoso que já estamos, tecnicamente obsoletos. Um carro anda mais rápido que um homem, idem um avião, idem uma nave espacial. Esse é o cenário.

Voltando ao outro campo, a quem pertencerá esse manancial concentrado de poder? Nesse momento, apesar do simpático nome levar a palavra Open, sabemos que é uma tecnologia sensível para as grandes potências, e que até por isso, não será tão aberta assim, a começar pelas bases de dados que precisam alimentar tudo isso. Nesse ponto, empresas como o Google levam uma vantagem indiscutível.

O astrônomo dinamarquês Tycho Brahe coletou dados muito precisos sobre sistemas planetários, entregues a um dos melhores matemáticos daquela época, a quem coube, criar as leis de Kepler, 1609 e 1618. Desenvolver por décadas e no braço? Não será mais assim. O volume de dados armazenados sobre o Cosmos, a partir de sondas e telescópios como o mais poderoso deles, James Webb, se beneficiarão muito do que a Inteligência Artificial Generativa poderá fazer, e que ainda não sabemos.

O poder é tamanho, a ponto que diversos pensadores, Yuval Noah Harari, autor do excelente Sapiens, vem discutindo questões éticas pelas quais temos passado batidos. Em séries do Netflix, como Black Mirror – Episódio A Joan é péssima –  há um ótimo exemplo de situações inaceitáveis, que já estão acontecendo na prática, em escolas e com crianças e adolescentes. Não vai parar, os crimes de pedofilia, por exemplo, vão seguir para uma outro estágio de complexidade para rastreamento e caracterização.

Assim como assistimos acontecer na biologia com a clonagem de uma ovelha, e tudo que foi publicado sobre bioética para a seguir ser implementado como legislação, teremos que lidar com isso sob forma da lei, essa eterna retardatária, por força de sua função na sociedade, nada inventa, só regula, seguindo princípios atávicos. Isso, aliás, também vai mudar.